Saúde e segurança alimentar são dois temas que andam juntos. Alimentos seguros são essenciais para a saúde e o bem-estar das pessoas, dos animais e do meio ambiente, e é preciso pensar sobre políticas públicas que garantam impactos significativos no curso da vida de cada um de nós.
Por Brenda Lima, para o Instituto Aurora
É comum que num ano eleitoral pautas como saúde, emprego, alimentação, moradia, educação e outras estejam mais em voga e “na boca do povo”: essas questões lideram pesquisas de intenção de voto. Mas não é como se nos outros anos que antecedem um ano eleitoral essas necessidades não fossem observadas ou não vividas pelos eleitores e eleitoras. Muito pelo contrário, a relevância dessas pautas e demandas é tão grande, tamanha a importância de seus impactos, que não há como não se preocupar em como um novo candidato ou candidata vai tratar desses assuntos – e nesta abordagem, falaremos especificamente da pauta saúde e segurança alimentar: o poder do seu voto.
O que é saúde
Saúde não é um conceito fechado e envolve questões como os recursos e condições de saneamento básico (esgotamento sanitário, água encanada e tratada, manejos de resíduos sólidos e de águas pluviais, limpeza urbana e drenagem etc); indicadores de perfil populacional que abrangem faixa-etária, sexo, gênero, potencial reprodutivo, capacidade de trabalho e outros; tudo isso para que seja possível uma melhor compreensão de determinada coletividade para que, a partir deste mapeamento, haja uma identificação de suas demandas e necessidades para uma propositura de medidas de enfrentamento e tratamento dessas demandas, objetivando uma melhoria ou manutenção. No âmbito da saúde, essas medidas são políticas públicas que, embora pelo nome pareça que a responsabilidade é só do Estado, o particular – nós, as empresas etc – também tem responsabilidade em viabilizar a observância e a implementação.
Desse modo, sendo a saúde uma estrutura de inúmeros pilares importantes para a manutenção da qualidade de vida, todos nós devemos zelar pela nossa e pela do outro, de forma direta ou indireta. E o que isso quer dizer? Quer dizer que ao mesmo tempo em que existem profissionais da saúde especializados em atuações pontuais, como por exemplo: médicos, odontologistas, nutricionistas, fisioterapeutas, enfermeiros, técnicos e auxiliares; existem outros profissionais que atuam de forma integrativa, desenvolvendo atividades de igual importância nesse contexto, como por exemplo: pesquisadores das mais diversas temáticas das ciências biológicas, cientistas sociais, educadores físicos, agentes de saúde, agentes de endemia, gestores de resíduos, assistentes sociais e outros que se encaixam aqui, de alguma forma que você consiga imaginar.
→ Até aqui você já percebeu que a ciência é norteadora da solução para essas necessidades; que a educação é essencial na formação de profissionais competentes para lidar com essas demandas; que é necessária atuação das mais diversas camadas de classes sociais; e que o Poder Público é responsável pela criação de políticas públicas através de vagas de estudos, ou de emprego, demandando bastante mão-de-obra.
Além de toda essa estrutura acima, existe também uma outra de extrema importância na efetivação das Políticas Públicas, seja na viabilização ou no gozo delas, que são os particulares: nós, cidadãos e cidadãs ou grandes empresas, com grandes interesses econômicos. E aqui, nesse encontro de interesse público e privado, precisamos de atenção, pois as grandes empresas giram a economia que o Estado precisa para se movimentar e ela, na representação errada, pode comprometer e colocar em risco o direito fundamental ao exercício, ao gozo de saúde. Não basta uma estrutura inteira de profissionais “a postos” para a prestação de serviços relacionados à saúde; é preciso uma população inteira que necessite dessa demanda, de alguma forma.
Nesse contexto, chamamos a atenção para todos os funcionários das grandes empresas, para os cidadãos desempregados, para as crianças que não podem fazer nada sozinhas pelos seus interesses; chamamos atenção para refletir sobre quanto de recursos vai para manter essa população, sobre quem pode trabalhar para girar esse sistema econômico, sobre quanta energia e força física são necessárias para isso acontecer; chamamos atenção para toda a comida produzida, desperdiçada ou consumida, aproveitada ou descartada para manter toda uma população ativa, viva.
Nesse cenário, enfatizamos o pilar da segurança alimentar, pois é impossível existir um futuro sem o mínimo de recursos alimentícios de qualidade, satisfatórios, de relevante potencial nutritivo, suficientes e acessíveis à toda população; é impossível ter saúde para movimentar todo um sistema e viver a vida sem comida. Não dá para falar em Desenvolvimento Sustentável como Direito Humano sem promover a dignidade humana por meio de alimento, do sustento para toda e qualquer pessoa. Aliás, você sabe o que é segurança alimentar?
O que é segurança alimentar
Segurança alimentar é uma integração de situações capazes de promover o direito de todos terem acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, de forma suficiente a atender a fome sem comprometer as outras necessidades essenciais, baseando-se em boas práticas alimentares que promovam a manutenção da saúde e ainda, considerando contextos de diversidades culturais, ambientais (relacionados a recursos disponíveis), econômicas (afinal, sendo uma necessidade fundamental, todos têm que conseguir comprar comida) e principalmente, socialmente sustentáveis (sem agredir tanto o meio-ambiente, para que todos os seres vivos que habitam esse planeta continuem habitando e tendo condições de continuar).
Sendo assim, se uma nação consegue proporcionar de forma integrativa para todos os que nela vivem os recursos alimentares e instrumentos de cultivo necessários para que se mantenha nutrida, saciada e viva, a saúde é promovida. E com isso, há redução do risco de doenças e de outros agravos advindos da falta da promoção de saúde e, também, a possibilidade de um acesso mais igualitário e suficiente às ações de promoção, proteção e recuperação de saúde.
Há evidências de que um conjunto de boas práticas alimentares repercute na melhora do desempenho físico e principalmente mental, em que além da redução dos riscos de aparecimento de doenças crônicas não transmissíveis (como diabetes, hipertensão, outras doenças que comprometem o bom funcionamento do coração, câncer), há também um retardamento do processo de envelhecimento e fortalecimento do sistema imunológico. Está comprovado que comer comida de verdade aumenta a longevidade de vida, de maneira mais saudável. Mas o Relatório das Nações Unidas, referente a 2021, apontou que cerca de 828 milhões de pessoas no mundo enfrentaram fome crônica e que cerca de um terço dessas pessoas não tinha acesso a alimentos adequados, podendo fazer ao menos três refeições ao dia, durante o ano todo.
Como saúde e segurança alimentar estão conectadas
Diante da relevância desse assunto, percebe-se que os agentes políticos têm grande responsabilidade na viabilização da destinação de alimentos adequados e suficientes à toda a população, considerando ainda o acesso no que tange a fatores econômicos e, também, a qualidade em relação ao seu potencial nutricional. É muito importante que os representantes de uma nação tenham, em suas pautas, soluções adequadas e viáveis, atentando-se a todo o contexto de uma nação e suas subjetividades, de forma plural.
Precisamos, ainda, ter a consciência de um compromisso mundial com as boas práticas sustentáveis, em efetivação às metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, que objetiva a manutenção do Planeta Terra para as presentes e futuras gerações. Numa perspectiva em que os alimentos seguros são essenciais para a saúde e o bem-estar das pessoas, dos animais e do meio ambiente, isso significa que “todos podem coexistir e conviver de forma consciente na gestão dos recursos existentes, ou não haverá espaço para nada e nem ninguém”.
Nesse sentido, a saúde sendo um tema delicado e de tantos desdobramentos, é natural que seja uma das preocupações mais debatidas em ano eleitoral, porque tem importância e impactos significativos durante todos os dias dos anos subsequentes aos das eleições – impactos que se perpetuarão no curso do tempo da vida de cada um de nós e daqueles os quais nutrimos afeto. Além disso, por ser um tema que tem a atenção e preocupação mundial, por precisar da união de esforços de todos os países e indivíduos para que seja cuidado, inúmeros são os Conselhos dentro dos Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos Humanos que trabalham em ações de promoção e tratamento da violação desses direitos.
A Segurança Alimentar também deve ser considerada de uma forma multidisciplinar e interdisciplinar, pois ao passo em que as tratativas se complementam, também se desdobram a partir de si de forma integrativa. Por isso há, no mínimo, 11 dos 17 ODS que se relacionam com a promoção da Saúde e da Segurança Alimentar e Nutricional:
- ODS 2 – Fome zero e agricultura sustentável: acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável.
- ODS 3 – Saúde e bem-estar: assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades.
- ODS 6 – Água potável e saneamento: garantir disponibilidade e manejo sustentável da água e saneamento para todos.
- ODS 8 – Trabalho decente e crescimento econômico: promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos.
- ODS 9 – Indústria, inovação e infraestrutura: construir infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável, e fomentar a inovação.
- ODS 10 – Redução das desigualdades: reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles.
- ODS 11 – Cidades e comunidades sustentáveis: tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.
- ODS 12 – Consumo e produção responsáveis: assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis.
- ODS 13 – Ação contra a mudança global do clima: tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos.
- ODS 14 – Vida na água: conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.
- ODS 15 – Vida terrestre: proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da Terra e deter a perda da biodiversidade.
O que precisamos pensar sobre esse tema na hora de votar
Por isso ao votar, considerando toda a construção de consciência de classe e representatividade das sociedades múltiplas que compõem o nosso país, é necessário observar se os candidatos e candidatas que lá estão e/ou que pretendem continuar exercendo suas funções, bem como os novos que estão ingressando nos cenários políticos na tentativa de melhorar o país, têm pautas coerentes e viáveis no comprometimento com, de fato, viabilizar a promoção e concretização de políticas públicas que reforcem e subsidiem o necessário para proteger e efetivar a saúde da população, das mais diversas formas possíveis no território nacional. Também é preciso ponderar a saúde num viés amplo e chave para respaldar, frente à nação, o Brasil como um país comprometido e preocupado com o Desenvolvimento Sustentável por levar a sério os compromissos que assume em promover e proteger os Direitos Humanos mas, principalmente, por se importar com cada cidadão e cidadã que constitui o nosso país.
Por isso, quando for votar, reflita sobre a pessoa em quem você está cogitando te representar e representar os seus interesses através do seu voto; analise se a proposta dele se alinha com os valores que você acredita ser interessante para promover um país mais igualitário e seguro. Reflita se a proposta contempla a sua realidade, mas também se ela é capaz de contemplar as pluralidades que formam o nosso país e estas pessoas viverem bem, tal como você, na proporção de suas limitações e oportunidades – afinal, aos iguais, igual tratamento e aos desiguais, os tratamentos necessários que os coloquem em paridade de oportunidades e condições. Ao votar, conheça o histórico de atuação do seu candidato, mesmo que antes sua atuação não fosse política, mas principalmente se a atuação era na política. Vote em quem tem mais condições de se comprometer e de fato efetivar as propostas que discursa. Vote consciente de que todos necessitam, para sobreviver, de comida na mesa; de saúde física e de saúde mental e que não há como atingir um nível satisfatório de desenvolvimento sem uma visão integrada.
Por entender a importância de falarmos sobre o voto responsável, o Instituto Aurora promove o projeto Meu, Seu, Nosso Voto, cocriado com a Nossa Causa e a Escola de Política. São diversas frentes de ação, como rodas de conversa com jovens, materiais gratuitos para download, curadoria de conteúdo e podcast Nosso Voto. Inclusive, Saúde e Segurança Alimentar foi tema de um dos episódios do podcast, e também recomendamos acompanhar os perfis das convidadas deste episódio: Naomi Mayer – @fome.de.endenter, que fala, escreve e cozinha, ensinando muita coisa legal, saudável, acessível e (muito) gostosa para colocar na mesa; e O Joio e o Trigo, que investiga alimentação, saúde e a relação disso tudo com poder.