Em 10 de dezembro de 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi proclamada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). A partir daí inaugurou-se uma nova era, que mudou completamente a forma como encaramos o direito e a própria humanidade. Apesar de sua inegável importância, precisamos questionar até que ponto a Declaração Universal dos Direitos Humanos é, de fato, universal, contemplando as mais variadas culturas ao redor do globo. Vamos refletir sobre isso juntos?
Por Gabriela de Lucca, para o Instituto Aurora
(Foto: UN Photo)
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi pensada em um contexto pós-Segunda Guerra Mundial, tendo em vista as atrocidades cometidas naquele período. Ela foi elaborada por um comitê formado por nove pessoas influentes à época, representantes dos Estados Unidos, União Soviética, Canadá, Taiwan, Reino Unido, Chile, Austrália, França e Líbano.
Ao todo foram feitos 30 artigos, que abordaram questões relativas aos direitos básicos dos seres humanos. Entre as diversas pautas, a Declaração trouxe questões referentes à liberdade religiosa, liberdade de expressão, direito à propriedade e condenação de práticas como a tortura e a escravidão.
Após sua elaboração, o documento foi apresentado para votação aos países-membros da ONU, sendo que, das 58 delegações presentes, 48 votaram a favor. Hoje, todos os 193 países membros da ONU são signatários da DUDH.
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Publicado em 10/12/2021.
Seria a Declaração, de fato, universal?
A partir disso poderíamos pensar que a Declaração é, de fato, universal, já que temos 195 países reconhecidos no mundo, e 193 deles a ratificaram. Mas a questão não é tão simples e vamos te explicar o porquê.
Segundo dados divulgados pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em 2010 existiam 817.963 indígenas no Brasil, dos quais 17,5% não falavam a língua portuguesa. À época, essa população representava 305 etnias e 274 línguas diferentes. Essa, no entanto, não é uma condição exclusiva do Brasil. Em toda a América Latina a população indígena ultrapassa 45 milhões de pessoas.
Da mesma forma, não há como se falar em diversidade étnica sem considerar o continente africano. Estima-se que sejam milhares de grupos étnicos – algumas fontes falam em cerca de 3 mil, com mais de 1,5 mil idiomas diferentes, cada uma com seus costumes e peculiaridades.
Com essa breve e rasa observação já podemos imaginar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, mesmo com sua ratificação unânime, não consegue englobar as mais variadas culturas existentes ao redor do globo.
É importante destacar que não se pretende aqui tirar a importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Muito pelo contrário. O documento é extremamente importante, pois foi o pioneiro no tema e trouxe uma nova direção ao estudo e à interpretação do direito e da dignidade da pessoa humana. Contudo, é preciso fazer uma ressalva quanto a sua suposta universalidade.
De fato, a DUDH, assim como a ONU em seus órgãos mais elevados, revela uma perspectiva mais eurocêntrica, a qual, por questões coloniais, acabou sendo difundida para boa parte do mundo, especialmente para o ocidente. Apesar dessa grande influência, não é possível ter a pretensão de que essa concepção do mundo e do direito seja uma verdade absoluta para os mais diversificados povos.
Diálogos entre diferentes culturas
Segundo Boaventura de Sousa Santos, todas as culturas têm versões diferentes para o que é a dignidade da pessoa humana. E é comum que cada povo ache o seu conceito, a sua percepção mais completa ou absoluta. Mas, conforme explica o autor, para se construir uma noção multicultural é necessário compreender a incompletude, ou seja, a parcialidade de cada cultura e dialogar com outros povos, de igual para igual, sem qualquer pretensão de superioridade.
Nesse sentido, a professora Vera Maria Candau procurou enumerar alguns desafios que temos que enfrentar para promover esse diálogo, a partir de uma educação intercultural, que respeite e promova os direitos humanos, especialmente de forma a equilibrar os conceitos de igualdade e diferença.
O primeiro desafio, segundo a professora, seria a desconstrução de pré-conceitos e estereótipos em relação aos mais variados grupos socioculturais; o segundo, por sua vez, seria uma harmonização entre igualdade e diferença, especialmente nas áreas escolares, a partir de práticas pedagógicas; o terceiro seria o resgate da identidade cultural de cada pessoa, mas também de grupo dos quais façam parte; e, por fim, o quarto desafio seria promover experiências de interação entre grupos e pessoas diferentes.
Educação como um pilar
Os desafios enumerados pela professora Vera Candau, como podemos perceber, passam pela educação, sendo essa a principal ferramenta para alcançarmos um diálogo com o outro e o tão importante multiculturalismo defendido pelo professor Boaventura de Sousa Santos.
Aqui no Instituto Aurora um dos nossos pilares é justamente a educação, em especial a educação em direitos humanos. Buscamos democratizar esse tema e trazer diferentes perspectivas culturais para enriquecer o debate. Separamos para vocês alguns textos publicados aqui no Blog relacionados a essa temática:
- O que a história de vida de Malala pode ensinar sobre Direitos Humanos para seus alunos?
- Como fazer um “Dia do Índio” educativo na escola?
- Filmes de impacto social contribuem para educar em direitos humanos
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