Você sabia que o Brasil é considerado um dos países mais violentos do mundo? Descubra quais são as causas e como prevenir a violência social.
Por Sergio Aiache de Souza, para o Instituto Aurora
(Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil)
A violência social não é uma prática recente da nossa sociedade, muito menos no nosso país.
A verdade é que a violência no Brasil é uma realidade desde os tempos de colonização.
Isso porque quando os portugueses desembarcaram em terras brasileiras, apropriaram-se das terras que pertenciam aos indígenas e impuseram violentamente a sua cultura, branca e europeia, sobre a cultura indígena.
Essa imposição dos portugueses é uma violência social que tentava anular forçadamente a individualidade, a realidade, a religião e a cultura de homens e mulheres indígenas.
Com isso, esse povo foi excluído socialmente e perdeu acesso aos seus bens, às suas terras, e essa exclusão é um dos fatos causadores da violência que vemos nos dias de hoje.
Isso porque esse sistema econômico que concentra a posse de terras, concentra também o acesso à educação e à saúde, ou seja, quem alcança os direitos básicos são as classes dominantes, sendo quase impossível uma ascensão social pelo povo mais pobre, o que mantém as pessoas em classe social marginalizada sem acesso aos serviços básicos.
Essa história infelizmente se repete no nosso país em 1888, com a abolição da escravização.
Os descendentes de africanos que eram escravizados no Brasil foram libertos, mas não receberam nenhum tipo de apoio social, como políticas públicas, por exemplo, nem mesmo receberam algum valor como indenização.
Pelo contrário, é até difícil de acreditar que a indenização foi dada não às mulheres e aos homens pretos escravizados, mas sim aos donos da terra, aos escravizadores.
Mulheres e homens pretos foram deixados à margem da sociedade sem emprego, sem educação, sem comida, sem moradia, indo ocupar locais onde ninguém mais queria morar, como as periferias e favelas.
E o que queremos dizer com isso? Que o sistema econômico brasileiro criou uma riqueza concentrada, impedindo que a maioria da população atingisse uma condição social melhor.
A verdade é que a violência no Brasil é histórica, sistêmica e estrutural, devido a desigualdade socioeconômica, a ausência de oportunidades para as pessoas mais pobres e a falta de construção de políticas públicas sociais.
Esses fatos fizeram com que a violência no Brasil crescesse exponencialmente depois da segunda metade do século XX.
Hoje, o Brasil é considerado um dos países mais violentos do mundo, além de ter uma das maiores populações carcerárias.
Pensando nisso, escrevemos esse texto para nos aprofundarmos nos principais pontos da violência social no Brasil e sabermos como a educação em direitos humanos pode contribuir para minimizarmos esse fato. Então, continue lendo para saber mais.
Tópicos do artigo:
- O que é violência social?
- Principais causas da violência social nos dias de hoje
- Como prevenir a violência social?
- Como a educação em direitos humanos pode minimizar a violência social?
Publicado em 06/12/2023.
O que é violência social?
A violência social começou a ser debatida e estudada como um fato social a partir do século XIX, sendo considerada como um fenômeno complexo e dinâmico que nasce da vida em sociedade.
Mas será que a violência social é uma característica biológica? Ou seja, ser violento é da natureza humana?
Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau são dois pensadores importantes da história da filosofia moderna, que nos ajudam a analisar a relação da violência e da natureza humana. Vamos refletir juntos?
Para Hobbes, o ser humano é naturalmente perverso, mau e egoísta. Uma famosa frase do pensador resume o que estamos falando: “o homem é o lobo do homem”, ou seja, o ser humano é o maior inimigo dele mesmo.
Por outro lado, Rousseau acreditava que “o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe”, isto é, as nossas ações não passam de um reflexo do ambiente em que vivemos e das relações sociais que construímos.
E você? Concorda com Hobbes ou com Rousseau?
O fato é que a violência social não é vista como parte da natureza humana, não somos naturalmente ruins, não há comprovações biológicas que provem isso.
Aqui, vamos considerar que a complexidade da violência social acontece na vida em sociedade, é um fenômeno resultante do convívio social e das nossas condições sociais, econômicas, éticas, políticas e religiosas.
Principais causas da violência social nos dias de hoje
A violência social no Brasil está presente em diferentes ambientes e grupos sociais, existe violência nas famílias, no trabalho, nas escolas, na rua, ou seja, em todos os lugares.
Os espaços públicos, por exemplo, que são criados e pensados para as pessoas conviverem juntas e em harmonia, na maioria das vezes geram insegurança e medo, porque são locais onde acontecem diferentes tipos de violências.
É importante ressaltar que no Brasil essa violência faz diferentes vítimas, mas ela é cometida principalmente contra pessoas negras, LGBTQIA+, mulheres, indígenas, defensores dos direitos humanos e crianças e adolescentes.
Por isso, discutir a violência social é tão importante, pois ela é inerente das relações sociais e tem algumas particularidades quando cometida contra grupos que foram historicamente prejudicados pelo próprio sistema.
A partir de agora, vamos ver algumas das principais causas da violência social no Brasil que se mantêm até hoje:
Desigualdade social
O sistema econômico brasileiro é excludente, por isso a desigualdade social no nosso país é tão repetida e crescente.
Direitos básicos que são formalmente garantidos para todas as pessoas pela Constituição Federal, ficaram só no papel, pois não temos o acesso à educação, à saúde e ao trabalho disponíveis para milhões de brasileiros.
Quando uma sociedade não tem acesso básico aos meios de sobrevivência e subsistência, o surgimento da violência é quase que inevitável.
Guerra às drogas e crime organizado
Outro fator que alimenta a violência no Brasil é a política de guerra às drogas, pois ela cria uma situação de violência generalizada contra as pessoas que têm maior vulnerabilidade econômica, social e étnico-racial.
A grande justificativa da guerra às drogas é o vício que elas geram nas pessoas, causando condutas violentas e destrutivas.
O Estado acredita que a criminalização das drogas e o combate repressivo irão reduzir a violência e gerar proteção para as pessoas.
O fundamento é de que a repressão, por parte das forças policiais e do Estado, vai dificultar o acesso às drogas, diminuindo a quantidade de usuários e, consequentemente, reduzindo a violência.
Mas, na prática, o que vem acontecendo é exatamente o oposto. Todos os anos vemos diferentes confrontos armados entre policiais e grupos criminosos que acabam vitimando pessoas inocentes, na maioria negros, jovens e pobres.
Não existe nenhuma preocupação se a guerra às drogas está gerando cada dia mais violência, ocasionando mortes de pessoas inocentes e corrupção policial, o que aumenta ainda mais a criminalidade.
A repressão às drogas tem sido um grande fracasso, as estratégias atuais de combate estão gerando mais violência e matando mais pessoas do que pretendia combater.
Isso sem contar que o Estado investe valores exorbitantes nas políticas de proibição das drogas, dinheiro que está sendo mal investido, pois nitidamente não está gerando resultados.
A verdade é que todo esse dinheiro poderia estar sendo investido em políticas públicas para educar e informar as pessoas sobre os danos causados pelo uso de entorpecentes.
Por causa desses fatos que a guerra às drogas é uma das principais causas da violência social hoje no Brasil.
Como prevenir a violência social?
Como você pôde perceber no capítulo anterior, a persistência de práticas repressivas e fragmentadas por parte do Estado e das forças policiais não têm contribuído para a redução da violência social.
Já ficou evidenciado e comprovado pela experiência prática de outros países que os investimentos em prevenção são muito mais eficazes e têm resultados mais expressivos.
Não podemos mais continuar concentrando os investimentos para redução da violência somente na Segurança Pública e no trabalho policial.
É nítido que as forças policiais são importantes no campo da Segurança, mas é obrigação da União e dos Estados aperfeiçoá-las e capacitá-las para que cumpram a Lei e para que seus atos estejam de acordo com os pressupostos dos Direitos Humanos.
É nesse cenário que a prevenção à violência surge como uma ferramenta valiosa para reduzir os índices de criminalidade.
Para isso, é necessário antes de mais nada conhecer a dimensão e as características dessa violência. Algumas ferramentas de prevenção são:
- Enfrentar a desigualdade social, com políticas públicas para incluir os grupos sociais mais vulneráveis, garantindo acesso à educação, à saúde e ao trabalho;
- Estruturar a administração pública para garantir uma gestão de segurança pública mais eficaz;
- Investir em inclusão social para a população carcerária;
- Reduzir o acesso e o uso de armas;
- Fomentar a educação sobre uso das drogas;
- Enfrentar a violência doméstica e a violência contra as mulheres;
- Enfrentar o racismo e a LGBTfobia.
Não conseguimos esgotar a discussão sobre a prevenção da violência social no Brasil, são muitos fatores e diferentes estratégias que devem ser implementadas ao longo dos anos, mas esse é um grande começo que tem dado certo e se mostrado mais eficaz.
Como a educação em direitos humanos pode minimizar a violência social?
“Vida com paz é direito humano”, essa é uma das frases que movem o Instituto Aurora. A paz e a justiça são objetivos pelos quais trabalhamos.
Por isso, acreditamos na busca de soluções para prevenção e redução da violência, com projetos educativos que propaguem a justiça social e proporcionem o diálogo.
Assim, é possível aumentar o respeito e a confiança entre as pessoas.
Construir uma cultura de paz é uma das missões dos direitos humanos, mas o que isso quer dizer?
Quer dizer que precisamos educar crianças, adolescentes e adultos para compreenderem princípios como liberdade, justiça, democracia, tolerância, igualdade e solidariedade, para que assim as pessoas sejam capazes de rejeitar qualquer tipo de violência que tenha integrado nossa sociedade.
A gente sabe que o desafio é grande, mas a educação em direitos humanos é essencial.
Com um cultura de paz, podemos ter uma nova perspectiva de respeito a diversidade, criando uma sociedade antirracista, antimachista e antihomofóbica. Estes são alguns dos principais entraves que precisamos romper hoje na nossa sociedade.
Não podemos mais tolerar violência contra mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+.
A educação em direitos humanos nos ensina a valorizar as diversidades e aprender mais sobre a cultura africana, afro-brasileira e a cultura indígena, por exemplo, o que ajuda no combate à violência contra essas pessoas.
Sem contar que a educação em direitos humanos tem papel fundamental na extinção das desigualdades sociais, que é uma das principais causas da violência social.
Com a educação em direitos humanos, é possível construir caminhos para termos no futuro uma sociedade mais igualitária, sem preconceitos e discriminações.
Assim, é possível desenvolver uma sociedade solidária e cooperativa e reduzir a violência social.
Quer saber mais de perto como funciona a atuação do Instituto Aurora para desenvolver uma cultura de paz? Clique aqui.
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Algumas referências que usamos neste artigo:
Prevenção da violência – Pesquisas, diagnósticos e análises | Fórum Brasileiro de Segurança Pública