No Brasil os ataques às escolas são fenômenos recentes, que tiveram início na primeira década dos anos 2000. Desde então, até o primeiro trimestre de 2023, foram contabilizados 24 ataques às escolas ocorridos em nosso país, que deixaram ao todo 137 vítimas fatais e não fatais. O aumento exponencial de casos ano a ano tem preocupado a todos nós, razão pela qual entendemos que precisamos falar sobre os ataques às escolas.

Por Gabriela de Lucca, para o Instituto Aurora

(Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil)

Antes de começar esse texto, precisamos deixar explicado que não serão citados os nomes dos assassinos que cometeram os ataques às escolas ou seu modus operandi. Isso se dá em razão do nosso compromisso ético e social com o enfrentamento a esse tipo de violência, que muitas vezes é incentivada pela midiatização dada ao agressor.

É necessário que se entenda que esse é um tipo de violência peculiar. Não observamos, nesses casos, um crime passional, executado em razão de um impulso imediato de raiva, de forma não premeditada; também não podemos enquadrá-los naqueles crimes premeditados contra pessoas determinadas e por motivos específicos, como dívida, ciúmes ou vingança. Ressalta-se, obviamente, que nenhum crime é justificado, mas muitos deles podem ser racionalizados de forma mais “simples”, o que não ocorre nos ataques às escolas.

Em geral, os massacres em escolas são baseados em crenças extremistas, pautadas em supremacia masculina e branca. Tais crenças são cientificamente falsas, moralmente censuráveis e socialmente injustas, reproduzidas por pessoas interessadas em conter ou anular avanços e transformações em relação a gênero e raça.

Esse é um movimento observado não apenas no Brasil, mas ao redor de todo mundo, e está relacionado à ascensão de líderes políticos de extrema-direita, que apresentam proposições legislativas para impedir a diversidade nas escolas, buscando reforçar ideias tradicionalistas e ultraconservadoras. Esse movimento, contudo, extrapola a esfera político-partidária e se espalha, com facilidade, para outros campos sociais, especificamente através da divulgação em massa de conteúdos extremistas e violentos pela internet, ambiente profícuo devido à ausência de monitoramento e fiscalização. 

O que vamos abordar neste artigo:

Publicado em 01/11/2023.

Breve análise dos ataques às escolas no Brasil

Especificamente no Brasil, percebe-se que os casos de ataques às escolas aumentaram exponencialmente a partir de 2019, momento de grande exaltação à extrema-direita no contexto político brasileiro. Segundo o Instituto Sou da Paz, entre 2002 e 2018 ocorreram 7 ataques às escolas, já entre 2019 e 2022 os números chegaram a 17. 

Dos 24 ataques às escolas ocorridos no Brasil entre 2002 e abril de 2023, todos ocorreram na educação básica, incluindo educação infantil, fundamental e ensino médio em instituições públicas e particulares. Nesses 24 ataques, 137 pessoas foram vitimadas, fatalmente ou não.

O Instituto Sou da Paz ainda fez uma análise regionalizada dos casos até abril de 2023, chegando à conclusão que o Sudeste lidera os índices com doze casos, seguido por Nordeste e Sul, com respectivamente cinco e quatro casos. O Centro-oeste reuniu apenas dois casos (todos em Goiás) e a região Norte só teve um caso, ocorrido no Amazonas. 

Todos os ataques no Brasil foram realizados por jovens do sexo masculino, que apresentavam, na ocasião do crime, entre 10 e 25 anos de idade. Ressalta-se que apenas 7% dos massacres foram cometidos por indivíduos que não eram alunos ou ex-alunos da escola atingida.

Perfil dos agressores

Relativamente aos agressores, Telma Vinha, professora e coordenadora do grupo “Ética, diversidade e democracia na escola pública” do Instituto de Estudos Avançado da UNICAMP, participou do Podcast “O Assunto” e traçou um perfil dos perpetrados dos ataques. Segundo ela, a grande maioria dos massacres são realizados por alunos ou ex-alunos, meninos, brancos, heterossexuais e jovens, que manifestam gosto por violência, armas e subculturas extremistas. 

Conforme se extrai da entrevista com a professora Telma Vinha e de textos publicados sobre o assunto, os agressores são pessoas com pouca habilidade social, que se sentem acolhidas no ambiente virtual, onde podem ser (ou parecer ser) outra persona: mais corajosa e confiante. Tudo isso é inflamado pelos grupos extremistas, que acolhem e incentivam a resolução dos problemas através da violência

Nos termos de relatório da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, são diversos os meios e métodos de cooptação dessas pessoas, entre eles: uso de humor; uso de estética e linguagem violentas como a linguagem da machosfera; trollagem; uso de jogos online; uso de imagens de ataques e compartilhamento de manifestos de atiradores como método de propaganda; etc. 

É importante destacar que o perfil traçado pelos profissionais não é absoluto, obviamente existem pessoas com essas características que não cometem crime. Contudo, as características mencionadas são sinais a serem observados de perto pela família e escola, que devem se movimentar para promover o acolhimento desses jovens através de práticas positivas.

A midiatização dos ataques às escolas

Vimos acima que os agressores, em regra, são pessoas com baixa autoestima, que associam a escola a um ambiente de sofrimento, e pretendem se sobressair a partir da violência, com o incentivo de uma subcultura extremista.

Segundo o Jeduca, a motivação dos ataques, muitas vezes, é se vingar e mostrar o próprio valor, fazendo o maior número possível de vítimas. E a intenção é ser visto, ser reconhecido pelo ataque, então a visibilidade alcançada na mídia é um dos efeitos desejados pelos agressores

De fato, a professora Telma Vinha conta que o ataque ocorrido em Columbine, nos Estados Unidos, em 20 de abril de 1999, foi um marco midiático muito grande que causou imensa influência nos ataques seguintes, tanto na escolha das armas, das roupas, da preparação, e, até mesmo, da data, já que a maioria das ameaças ocorrem em abril.

Por todas essas peculiaridades a envolver os ataques às escolas e seus perpetradores, são necessários cuidados ao divulgar notícias sobre os crimes. Conforme demonstrado no webnário “A cobertura jornalística de ataques a escolas”, pesquisas indicam que a mídia pode influenciar na proliferação desses ataques por parte desses jovens e adolescentes, aumentando a probabilidade que eles voltem a acontecer ou sejam imitados.

Diante disso, a professora Telma Vinha afirma ser fundamental que não se divulgue nada sobre a forma e o planejamento do ataque pelo assassino. Há, ainda, um movimento de não divulgar os dados do agressor, impedindo, assim, que um dos seus principais objetivos se realize: a fama. Por esse motivo, optamos por não trazer neste texto qualquer informações sobre agressores específicos e seu modus operandi, contribuindo, assim, para o enfrentamento aos ataques às escolas no Brasil e no mundo.

Caminhos possíveis para a diminuição dos ataques às escolas

Não é possível o enfrentamento dos ataques às escolas com atitudes reducionistas. Os Estados Unidos investiram recursos na contratação de mais efetivo policial e em medidas de seguranças em escolas, contudo nada disso se mostrou frutífero. No Brasil, uma escola cívico-militar, que contava com militares no local, foi atacada em 2022.

A escola é um organismo vivo e deve permanecer aberta à comunidade. No entanto, é preciso investir em políticas públicas e treinamento de profissionais para que promovam uma educação inclusiva, acolhedora e aberta ao diálogo.

No que diz respeito a algumas práticas a serem tomadas, Telma Vinha, em entrevista ao Podcast “O Assunto”, elencou algumas medidas possíveis para se buscar uma redução dos ataques às escolas:

  • Políticas que indicam a responsabilização de plataformas que reproduzem esses tipos de violência;
  • Canal único de denúncia, com investigação concentrada e rápido acesso às informações de suposta ameaça em todo o país;
  • Escola como espaço de prevenção de conflitos, através da aprendizagem de convivência coletiva, espaço de mediação de conflitos, equipe de ajuda formada jovens, mapeamento dos comportamentos nas escolas;
  • Inserção no currículo escolar sobre convivência ética online;
  • Preparação de professores;

As medidas propostas pela professora Telma são de extrema importância, uma vez que trata do problema de forma integrada, combinando os esforços de diversas instituições sociais e estatais. 

O Instituto Aurora acredita que é através da educação que podemos reverter esse quadro de ataques às escolas, especialmente a educação em direitos humanos, buscando semear um senso de empatia nos alunos desde a primeira infância e ao longo de toda sua jornada estudantil. Através disso, podemos prevenir o bullying e fortalecer o respeito, independente de gênero, raça e cor.

Por isso, criamos o projeto “(Re)conectar: aproximando pessoas para superar a violência às escolas”. Saiba mais sobre o projeto e como contribuir.

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Algumas referências que usamos neste artigo:

Ataques a escolas: possibilidades para evitar novas ações violentas | Nova Escola

Brasil e a crescente violência nas escolas | Latinoamérica21

Clima escolar: da indisciplina e violência às relações e regras de convivência | Cenpec

Como o aumento da violência nas escolas afeta o professor? | Nova Escola

Violência premeditada e gestada na convivência tóxica | Unicamp

Pontes ou muros: o que você têm construído?
Em um mundo de desconstrução, sejamos construtores. Essa ideia foi determinante para o surgimento do Instituto Aurora e por isso compartilhamos essa mensagem. Em uma mescla de história de vida e interação com o grupo, são apresentados os princípios da comunicação não-violenta e da possibilidade de sermos empáticos, culminando em um ato simbólico de uma construção coletiva.
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Quem é você na Década da Ação?
Sabemos que precisamos agir no presente para viver em um mundo melhor amanhã. Mas, afinal, o que é esse mundo melhor? É possível construí-lo? Quem fará isso? De forma dinâmica e interativa, os participantes serão instigados a pensar em seu sistema de crenças e a vivenciarem o conceito de justiça social. Cada pessoa poderá reconhecer suas potencialidades e assumir a sua autorresponsabilidade.
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A vitória é de quem?
Nessa palestra permeada pela visão de mundo delas, proporcionamos um espaço para dissipar o medo sobre palavras como: feminismo, empoderamento feminino e igualdade de gênero. Nosso objetivo é mostrar o quanto esses termos estão associados a grandes avanços que tivemos e ainda podemos ter - em um mundo em que todas as pessoas ganhem.
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Liberdade de pensamento: você tem?
As projeções para o século XXI apontam para o exponencial crescimento da inteligência artificial e da sua presença em nosso dia a dia. Você já se perguntou o que as máquinas têm aprendido sobre a humanidade e a vida em sociedade? E como isso volta para nós, impactando a forma como lemos o mundo? É tempo de discutir que tipo de dados têm servido de alimento para os robôs porque isso já tem influenciado o futuro que estamos construindo.
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Formações customizadas
Nossas formações abordam temas relacionados à compreensão de direitos humanos de forma interdisciplinar, aplicada ao dia a dia das pessoas - sejam elas de quaisquer áreas de atuação - e ajustadas às necessidades de quem opta por esse serviço.
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Consultoria em promoção de diversidade
Temos percebido um movimento positivo de criação de comitês de diversidade nas instituições. Com a consultoria, podemos traçar juntos a criação desses espaços de diálogo e definir estratégias de como fortalecer uma cultura de garantia de direitos humanos.
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Minha empresa quer doar

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    Depoimento de professora de Campo Largo
    Em 2022, nosso colégio foi ameaçado de massacre. Funcionárias acharam papel em que estava escrito o dia e a hora que seria o massacre (08/11 às 11h). Também tinha recado na porta interna dos banheiros feminino e masculino. Como gestoras, fizemos o boletim de ocorrência na delegacia e comunicamos o núcleo de educação. A partir desta ação, todos as outras foram coordenadas pela polícia e pelo núcleo. No ambiente escolar gerou um pânico. Alunos começaram a ter diariamente ataque de ansiedade e pânico. Muitos pais já não enviavam os filhos para o colégio. Outros pais da comunidade organizaram grupos paralelos no whatsapp, disseminado mais terror e sugestões de ações que nós deveríamos tomar. Recebemos esporadicamente a ronda da polícia, que adentrava no colégio e fazia uma caminhada e, em seguida, saía. Foram dias de horror. No dia da ameaça, a guarda municipal fez campana no portão de entrada e tivemos apenas 56 alunos durante os turnos da manhã e tarde. Somente um professor não compareceu por motivos psicológicos. Nenhum funcionário faltou. Destacamos que o bilhete foi encontrado no banheiro, na segunda-feira, dia 31 de outubro de 2022, após o segundo turno eleitoral. Com isto, muitos estavam associando o bilhete com caráter político. A polícia descartou essa possibilidade. Enfim, no dia 08, não tivemos nenhuma ocorrência. A semana seguinte foi mais tranquila. E assim seguimos. Contudo, esse é mais um trauma na carreira para ser suportado, sem nenhum olhar de atenção e de cuidado das autoridades. Apenas acrescentamos outras ameaças (as demandas pedagógicas) e outros medos.
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