Em 2003, a Lei 10639 entrou em vigor e alterou a Lei de Diretriz da Educação, tornando obrigatória a inclusão da história e cultura afro-brasileira na grade curricular do ensino fundamental e médio. Desde então, escolas de todo o Brasil têm compartilhado novas práticas que vêm transformando gradativamente o ensino tradicional, tornando-o mais inclusivo e diversificado, refletindo, assim, a real face da população brasileira. Vamos conhecer algumas dessas experiências e observar como elas colaboram para a construção de uma sociedade antirracista?

Por Gabriela de Lucca, para o Instituto Aurora

(Foto: Tima Miroshnichenko / Pexels)

A Lei 9394, conhecida por estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional, foi publicada em 1996 e, em sua versão original, pouco abordava sobre a questão étnico-racial. Contudo, em 2003, após muitos anos de luta dos movimentos sociais, foi aprovada a Lei 10639 que estabeleceu a obrigatoriedade da inclusão da história e cultura afro-brasileira no currículo das escolas brasileiras

Com isso, o conteúdo programático do ensino médio e fundamental passou a incluir o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. Conforme dispõe a lei, esses conteúdos devem ser ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, mas especialmente nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.

A fim de aprofundar o tema e estabelecer orientações às instituições de ensino, o Ministério da Educação publicou em 2004 a Diretriz Nacional para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, através da qual confirma a necessidade de políticas de reparação, bem como busca a desmistificação da democracia racial no país. Não apenas, o texto explicita uma série de equívocos comuns no momento da abordagem da questão racial e direciona os professores quanto ao tratamento adequado ao tema.

Ainda, com o objetivo de acompanhar na prática a implementação da lei e auxiliar na produção e disseminação de conteúdo sobre a história da África e dos afro-brasileiros, a UNESCO, em parceria com o MEC e com a Universidade de São Carlos (UFSCar), publicou, em 2010, a versão em português da coleção completa da História Geral da África. Ela conta com 8 volumes produzidos por mais de 350 especialistas das mais variadas áreas do conhecimento, sob a direção de um Comitê Científico Internacional. Todos os volumes da coleção estão disponíveis em formato digital (PDF) e podem ser acessados gratuitamente no site da UNESCO.

Ressalta-se que essa obra capitaneada pela UNESCO já foi publicada em diversos idiomas e tem como propósito justamente ampliar o conhecimento sobre outras civilizações e culturas, permitindo, assim, uma melhor compreensão e enfrentamento aos conflitos raciais e o fortalecimento dos Direitos Humanos. 

O que vamos abordar neste artigo:

Publicado em 23/06/2021.

A importância da educação no combate à discriminação racial

Em novembro de 2020, a UNESCO transmitiu através de seu canal no YouTube um Webinar com diversos especialistas para discutir a função da escola no combate ao racismo. Na oportunidade, foi discutida a importância da aprendizagem para a formação de um pensamento mais amplo, que supere os preconceitos e reconheça o papel fundamental da cultura africana na construção da sociedade brasileira.

No debate, a cientista política e professora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (NEPP-DH/UFRJ), Fernanda Barros, defendeu a educação como chave para o fim do “colonialismo do saber”, que hierarquiza o conhecimento e “leva a visão eurocêntrica de mundo para os bancos escolares”.

Do mesmo modo, a professora da rede pública de ensino do Distrito Federal, Gina Vieira Ponte, lembrou que a educação tradicional brasileira sempre se pautou em uma matriz branca judaico-cristã, que abordava a cultura indígena e africana tão somente como parte do folclore brasileiro. A professora afirmou, ainda, que a educação é uma área estratégica para reparar o processo de “apagamento de símbolos e referências da cultura afro-brasileira”.

Os diversos especialistas convergiram no sentido de que o sistema educacional é extremamente relevante para a construção de novas perspectivas sobre a história dos povos do Continente Africano e, consequentemente, para a construção de uma identidade positiva, sem estigmas ou estereótipos, acerca da população afro-brasileira.

Práticas que têm corroborado para o combate à discriminação racial

O Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade criou, em 2002, o Projeto Educar para a Igualdade Racial e de Gênero, que conta com um acervo de mais de 3.000 práticas escolares voltadas à promoção da igualdade étnico-racial. Desde o seu início, o projeto foi responsável por:

  • 9 publicações ilustradas (catálogos, livros, revistas), que atingiram aproximadamente 52.000 educadores de todo o país;
  • 12 vídeos com experiências de todas as regiões do país, no projeto A cor da Cultura, do Canal Futura;
  • 2 séries do programa televisivo Salto para o Futuro, da TVE do Rio de Janeiro; entre outras práticas voltadas à educação básica.

Ao expor experiências construtivas para uma sociedade antirracista, também é necessário reconhecer o trabalho de Lúcia Cristina Cortez de Barros Santos, Diretora da Escola Municipal Professor Waldir Garcia, em Manaus (AM), que foi um dos destaques do Prêmio Educador Nota 10 de 2020. 

Segundo ela, em entrevista publicada pelo site Futura, o aumento de matrículas de crianças refugiadas em vulnerabilidade social fez com que fosse necessário repensar a prática pedagógica tradicionalmente adotada, uma vez que ela acentuava as desigualdades. Com isso, pensou-se em uma gestão democrática e participativa, com metodologias ativas, que colocam estudantes no centro do processo de aprendizagem, levando em conta suas singularidades e diversidades. 

Não obstante a eficácia da reformulação da metodologia de ensino tradicional, sabemos que isso nem sempre é possível. Contudo, tais dificuldades não podem impedir a adoção de pequenas práticas que contribuem diretamente para a inclusão e representatividade em sala de aula, tais como: leitura, exibição de filmes e, até mesmo, esportes que trazem à tona o debate étnico-racial

Em nosso site você encontra diversas dicas sobre a promoção dos Direitos Humanos na educação, inclusive o projeto Biblioteca Mais Plural, pensado para a ampliação do reconhecimento, respeito e valorização das diferenças. Quer saber mais sobre nosso trabalho? Navegue pela seção Quem Somos aqui do site!

Acompanhe o Instituto Aurora nas redes sociais: Instagram | Facebook | Linkedin | Youtube

Algumas referências que usamos neste artigo:

A Cor da Cultura

Prêmio Educar

Webinário História Geral da África e Discriminação Racial: o que mudou no Brasil?

“A nossa prática pedagógica tradicional acentuava as desigualdades”

Lei 10639/03

Programa Brasil-África: Histórias Cruzadas

Pontes ou muros: o que você têm construído?
Em um mundo de desconstrução, sejamos construtores. Essa ideia foi determinante para o surgimento do Instituto Aurora e por isso compartilhamos essa mensagem. Em uma mescla de história de vida e interação com o grupo, são apresentados os princípios da comunicação não-violenta e da possibilidade de sermos empáticos, culminando em um ato simbólico de uma construção coletiva.
Pontes ou muros: o que você têm construído?
Em um mundo de desconstrução, sejamos construtores. Essa ideia foi determinante para o surgimento do Instituto Aurora e por isso compartilhamos essa mensagem. Em uma mescla de história de vida e interação com o grupo, são apresentados os princípios da comunicação não-violenta e da possibilidade de sermos empáticos, culminando em um ato simbólico de uma construção coletiva.
Quem é você na Década da Ação?
Sabemos que precisamos agir no presente para viver em um mundo melhor amanhã. Mas, afinal, o que é esse mundo melhor? É possível construí-lo? Quem fará isso? De forma dinâmica e interativa, os participantes serão instigados a pensar em seu sistema de crenças e a vivenciarem o conceito de justiça social. Cada pessoa poderá reconhecer suas potencialidades e assumir a sua autorresponsabilidade.
Quem é você na Década da Ação?
Sabemos que precisamos agir no presente para viver em um mundo melhor amanhã. Mas, afinal, o que é esse mundo melhor? É possível construí-lo? Quem fará isso? De forma dinâmica e interativa, os participantes serão instigados a pensar em seu sistema de crenças e a vivenciarem o conceito de justiça social. Cada pessoa poderá reconhecer suas potencialidades e assumir a sua autorresponsabilidade.
A vitória é de quem?
Nessa palestra permeada pela visão de mundo delas, proporcionamos um espaço para dissipar o medo sobre palavras como: feminismo, empoderamento feminino e igualdade de gênero. Nosso objetivo é mostrar o quanto esses termos estão associados a grandes avanços que tivemos e ainda podemos ter - em um mundo em que todas as pessoas ganhem.
A vitória é de quem?
Nessa palestra permeada pela visão de mundo delas, proporcionamos um espaço para dissipar o medo sobre palavras como: feminismo, empoderamento feminino e igualdade de gênero. Nosso objetivo é mostrar o quanto esses termos estão associados a grandes avanços que tivemos e ainda podemos ter - em um mundo em que todas as pessoas ganhem.
Liberdade de pensamento: você tem?
As projeções para o século XXI apontam para o exponencial crescimento da inteligência artificial e da sua presença em nosso dia a dia. Você já se perguntou o que as máquinas têm aprendido sobre a humanidade e a vida em sociedade? E como isso volta para nós, impactando a forma como lemos o mundo? É tempo de discutir que tipo de dados têm servido de alimento para os robôs porque isso já tem influenciado o futuro que estamos construindo.
Liberdade de pensamento: você tem?
As projeções para o século XXI apontam para o exponencial crescimento da inteligência artificial e da sua presença em nosso dia a dia. Você já se perguntou o que as máquinas têm aprendido sobre a humanidade e a vida em sociedade? E como isso volta para nós, impactando a forma como lemos o mundo? É tempo de discutir que tipo de dados têm servido de alimento para os robôs porque isso já tem influenciado o futuro que estamos construindo.
Formações customizadas
Nossas formações abordam temas relacionados à compreensão de direitos humanos de forma interdisciplinar, aplicada ao dia a dia das pessoas - sejam elas de quaisquer áreas de atuação - e ajustadas às necessidades de quem opta por esse serviço.
Formações customizadas
Nossas formações abordam temas relacionados à compreensão de direitos humanos de forma interdisciplinar, aplicada ao dia a dia das pessoas - sejam elas de quaisquer áreas de atuação - e ajustadas às necessidades de quem opta por esse serviço.
Consultoria em promoção de diversidade
Temos percebido um movimento positivo de criação de comitês de diversidade nas instituições. Com a consultoria, podemos traçar juntos a criação desses espaços de diálogo e definir estratégias de como fortalecer uma cultura de garantia de direitos humanos.
Consultoria em promoção de diversidade
Temos percebido um movimento positivo de criação de comitês de diversidade nas instituições. Com a consultoria, podemos traçar juntos a criação desses espaços de diálogo e definir estratégias de como fortalecer uma cultura de garantia de direitos humanos.
Minha empresa quer doar

    Minha empresa quer doar
    [caldera_form id="CF5f3eb06356163"]
    Depoimento de professora de Campo Largo
    Em 2022, nosso colégio foi ameaçado de massacre. Funcionárias acharam papel em que estava escrito o dia e a hora que seria o massacre (08/11 às 11h). Também tinha recado na porta interna dos banheiros feminino e masculino. Como gestoras, fizemos o boletim de ocorrência na delegacia e comunicamos o núcleo de educação. A partir desta ação, todos as outras foram coordenadas pela polícia e pelo núcleo. No ambiente escolar gerou um pânico. Alunos começaram a ter diariamente ataque de ansiedade e pânico. Muitos pais já não enviavam os filhos para o colégio. Outros pais da comunidade organizaram grupos paralelos no whatsapp, disseminado mais terror e sugestões de ações que nós deveríamos tomar. Recebemos esporadicamente a ronda da polícia, que adentrava no colégio e fazia uma caminhada e, em seguida, saía. Foram dias de horror. No dia da ameaça, a guarda municipal fez campana no portão de entrada e tivemos apenas 56 alunos durante os turnos da manhã e tarde. Somente um professor não compareceu por motivos psicológicos. Nenhum funcionário faltou. Destacamos que o bilhete foi encontrado no banheiro, na segunda-feira, dia 31 de outubro de 2022, após o segundo turno eleitoral. Com isto, muitos estavam associando o bilhete com caráter político. A polícia descartou essa possibilidade. Enfim, no dia 08, não tivemos nenhuma ocorrência. A semana seguinte foi mais tranquila. E assim seguimos. Contudo, esse é mais um trauma na carreira para ser suportado, sem nenhum olhar de atenção e de cuidado das autoridades. Apenas acrescentamos outras ameaças (as demandas pedagógicas) e outros medos.
    Depoimento de professora de Campo Largo
    Em 2022, nosso colégio foi ameaçado de massacre. Funcionárias acharam papel em que estava escrito o dia e a hora que seria o massacre (08/11 às 11h). Também tinha recado na porta interna dos banheiros feminino e masculino. Como gestoras, fizemos o boletim de ocorrência na delegacia e comunicamos o núcleo de educação. A partir desta ação, todos as outras foram coordenadas pela polícia e pelo núcleo. No ambiente escolar gerou um pânico. Alunos começaram a ter diariamente ataque de ansiedade e pânico. Muitos pais já não enviavam os filhos para o colégio. Outros pais da comunidade organizaram grupos paralelos no whatsapp, disseminado mais terror e sugestões de ações que nós deveríamos tomar. Recebemos esporadicamente a ronda da polícia, que adentrava no colégio e fazia uma caminhada e, em seguida, saía. Foram dias de horror. No dia da ameaça, a guarda municipal fez campana no portão de entrada e tivemos apenas 56 alunos durante os turnos da manhã e tarde. Somente um professor não compareceu por motivos psicológicos. Nenhum funcionário faltou. Destacamos que o bilhete foi encontrado no banheiro, na segunda-feira, dia 31 de outubro de 2022, após o segundo turno eleitoral. Com isto, muitos estavam associando o bilhete com caráter político. A polícia descartou essa possibilidade. Enfim, no dia 08, não tivemos nenhuma ocorrência. A semana seguinte foi mais tranquila. E assim seguimos. Contudo, esse é mais um trauma na carreira para ser suportado, sem nenhum olhar de atenção e de cuidado das autoridades. Apenas acrescentamos outras ameaças (as demandas pedagógicas) e outros medos.