O casamento precoce no Brasil persiste como um desafio, apesar da legislação estabelecer a idade mínima de 18 anos. A prática prejudica os direitos e o desenvolvimento das meninas e meninos envolvidos. Veja o que podemos fazer para mudar essa realidade.

Por Andrea Weschenfelder, para o Instituto Aurora

(Imagem: Reprodução de vídeo de campanha da ONU)

O Brasil ocupa o 4º lugar no mundo em casamentos precoces com meninas em idade menor que 18 anos. Essas uniões limitam a vida dessas jovens.  

O casamento precoce é uma prática que afeta milhões de menores de idade em todo o mundo, e o Brasil não é exceção. Apesar dos avanços sociais e legais das últimas décadas, essa questão continua sendo um desafio no país. 

Os dados preocupam: 36% das meninas menores de idade são casadas. São 2,2 milhões de brasileiras mantendo um vínculo conjugal com outra pessoa. Esses números são ainda mais preocupantes em algumas regiões, como no Nordeste, onde a taxa chega a 45%. 

Essa realidade coloca o país na quarta posição no ranking mundial de casamentos infantis. 

Mas, por que isso ainda é uma realidade? Neste artigo vamos trazer quais são as causas e formas de combater essa violação.

Tópicos do artigo:

Publicado em 08/11/2023.

O que é casamento precoce?

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU) o casamento infantil é uma violação dos direitos humanos. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu artigo 2°, um indivíduo é considerado criança quando tiver até doze anos de idade incompletos, e adolescentes os maiores de 12 anos e menores de 18. 

Desta forma, casamento precoce é qualquer relação formal ou informal, em que uma das partes tenha menos de 18 anos. Ainda de acordo com o ECA, essa união só deveria acontecer quando ambas as partes tiverem plena capacidade emocional, legal e psicológica para consentir e responder pelos seus atos.

Mesmo sendo a idade mínima legal para o casamento de 18 anos para ambos os sexos, ainda assim no Brasil é permitida a união a partir dos 16 anos se houver a autorização dos pais ou responsáveis legais

E, embora não seja mencionado diretamente na Convenção sobre os Direitos da Criança, o casamento infantil está vinculado a outros direitos – como o direito à liberdade de expressão, à proteção de todas as formas de abuso e o de ser protegido de práticas tradicionais nocivas.

Brasil: dados alarmantes, esquecimento e manutenção da desigualdade e pobreza

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) traz o Brasil como o quarto colocado em registros de casamentos infantis. De acordo com a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), de 2021 até os primeiros três meses de 2023, mais de 7 mil menores de idade se casaram no Brasil. 

Em 2021, foram registrados mais de 3 mil casamentos infantis, outros 3 mil foram em 2022, e nos três primeiros meses de 2023 foram mais de 700 uniões com menores de idade.

Neste cenário, a maioria dos afetados é do sexo feminino. Contudo, mesmo com os números alarmantes, quase nada é feito para combater o casamento infantil. E os dados sinalizam a falta de debates oficiais sobre o assunto, o esquecimento nas agendas de governo, mantendo a desigualdade de gênero e o ciclo da pobreza.

Por que ainda acontece e quais os problemas causados pelo casamento precoce?

Existem várias razões para que essa realidade não mude no Brasil. Em muitos casos, a pobreza e a falta de oportunidades educacionais são os principais fatores. Muitas vezes as famílias veêm o casamento como a saída para aliviar os custos e garantir o futuro das suas filhas. 

Além disso, normas culturais dominantes e desigualdades de gênero também têm um papel significativo.

O casamento precoce traz uma série de consequências prejudiciais para as crianças e adolescentes envolvidos. Essas e esses jovens são forçadas a abandonar a educação formal, e acabam privadas de oportunidades de desenvolvimento pessoal e profissional. Também aumentam os riscos de violência doméstica, abuso sexual, gravidez na adolescência e problemas de saúde associados à maternidade precoce.

E depois, ao se casarem cedo, jovens têm menos chances de romper o ciclo da pobreza, enfrentam maiores dificuldades para acessar o mercado de trabalho e alcançar a independência financeira.

Como podemos ajudar a acabar com o casamento precoce

Para combater e evitar a união precoce é necessário adotar uma abordagem abrangente e coordenada que envolve diversos atores e medidas. Aqui estão algumas ações que podem ser tomadas:

Fortalecer a legislação

Os governos devem estabelecer e reforçar leis que estabeleçam uma idade mínima para o casamento em conformidade com os padrões internacionais, como os 18 anos para ambos os sexos. Essas leis devem ser aplicadas e acompanhadas de sanções adequadas para desestimular a prática do casamento precoce.

Investir em educação e conscientização

É fundamental investir em programas de educação e conscientização que informem as comunidades sobre os impactos negativos do casamento precoce. Isso inclui a educação sobre direitos humanos, igualdade de gênero, saúde sexual e reprodutiva, além de promover o acesso à educação de qualidade para meninas e meninos.

Empoderar as meninas

Assegurar que as meninas tenham acesso a oportunidades educacionais, capacitação profissional e recursos para desenvolver habilidades que lhes permitam tomar decisões informadas sobre seu futuro. Isso pode incluir programas, bolsas de estudo e apoio às suas ambições pessoais e profissionais.

Envolvimento com a comunidade

Trabalhar em parceria com líderes comunitários, religiosos e outras figuras influentes para promover mudanças de mentalidade e eliminar normas culturais prejudiciais que perpetuam o casamento precoce. É importante engajar a comunidade e fornecer espaços para diálogos abertos e inclusivos.

Acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva

Garantir que meninas e meninos adolescentes tenham acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva de qualidade, incluindo informações sobre contracepção, cuidados pré-natais, assistência ao parto e planejamento familiar. Isso é essencial para evitar a gravidez na adolescência e promover a saúde das jovens.

Apoio às vítimas

É necessário fornecer suporte e serviços de proteção às vítimas de casamento precoce, incluindo abrigos seguros, aconselhamento psicológico, assistência legal e acesso à justiça. Também é importante trabalhar para reintegrar essas meninas na sociedade, garantindo seu acesso à educação e oportunidades de emprego.

Cooperação internacional

Promover a cooperação entre governos, organizações não governamentais, agências das Nações Unidas e outros atores internacionais para compartilhar boas práticas, recursos e experiências na luta contra o casamento precoce. Isso pode incluir a mobilização de recursos financeiros e técnicos para apoiar programas e intervenções eficazes.

A eliminação do casamento precoce requer um esforço conjunto e contínuo em múltiplas frentes. É fundamental abordar as causas implícitas dessa prática e trabalhar para criar sociedades mais igualitárias, para que os direitos e o bem-estar das meninas sejam protegidos e valorizados.

Como a prevenção de casamentos precoces está conectada ao ODS 5?

Uma tentativa global para mudar esse cenário surgiu em 2015, quando a ONU, em sua Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável excluiu todas as práticas nocivas, incluindo os casamentos prematuros, forçados e de crianças.

Esse importante instrumento inclui 17 metas chamadas Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).  A série de propósitos e compromissos foram adotados por todos os 193 Estados-membros das Nações Unidas. Os ODS estão interconectados envolvendo uma ampla gama de questões socioeconômicas, ambientais e de governança. 

Mais especificamente, o ODS 5, na sua meta 5.3 atua diretamente sobre a luta e prevenção contra o casamento precoce quando prevê a igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas.

As nove metas nas quais o ODS 5 se desdobra procuram envolver as dimensões mais relevantes desta questão, passando por temas como violência, discriminação, reconhecimento do trabalho doméstico não remunerado, políticas de redução das desigualdades de gênero, entre outros.

Esforços conjuntos podem ajudar a eliminar a prática

No entanto, a implementação de leis e a conscientização da população sobre os efeitos negativos do casamento precoce ainda são desafios a serem enfrentados. Portanto, é necessário um esforço conjunto de governos, organizações da sociedade civil, educadores/as e comunidades para promover a igualdade de gênero, melhorar o acesso à educação e combater as normas culturais que perpetuam essa prática.

É importante que essas questões sejam abordadas por meio da conscientização, educação, empoderamento das mulheres e meninas, além do fortalecimento das leis e políticas para proteger os direitos das crianças e dos jovens.

Além disso, programas de apoio e empoderamento para as meninas são fundamentais para ajudá-las a tomar decisões sobre suas vidas.

O Instituto Aurora tem como objetivo promover e defender a Educação em Direitos Humanos. Conheça algumas de nossas ações pela igualdade de gênero.

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Algumas referências que usamos neste artigo:

Dados do Unicef apontam que o Brasil ocupa o 4º lugar em casamentos infantis no mundo | Agência Câmara de Notícias

Sete coisas que você não sabia sobre o casamento infantil | UNFPA

Tirando o véu: estudo sobre casamento infantil no Brasil | Plan International

Pontes ou muros: o que você têm construído?
Em um mundo de desconstrução, sejamos construtores. Essa ideia foi determinante para o surgimento do Instituto Aurora e por isso compartilhamos essa mensagem. Em uma mescla de história de vida e interação com o grupo, são apresentados os princípios da comunicação não-violenta e da possibilidade de sermos empáticos, culminando em um ato simbólico de uma construção coletiva.
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Sabemos que precisamos agir no presente para viver em um mundo melhor amanhã. Mas, afinal, o que é esse mundo melhor? É possível construí-lo? Quem fará isso? De forma dinâmica e interativa, os participantes serão instigados a pensar em seu sistema de crenças e a vivenciarem o conceito de justiça social. Cada pessoa poderá reconhecer suas potencialidades e assumir a sua autorresponsabilidade.
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A vitória é de quem?
Nessa palestra permeada pela visão de mundo delas, proporcionamos um espaço para dissipar o medo sobre palavras como: feminismo, empoderamento feminino e igualdade de gênero. Nosso objetivo é mostrar o quanto esses termos estão associados a grandes avanços que tivemos e ainda podemos ter - em um mundo em que todas as pessoas ganhem.
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Liberdade de pensamento: você tem?
As projeções para o século XXI apontam para o exponencial crescimento da inteligência artificial e da sua presença em nosso dia a dia. Você já se perguntou o que as máquinas têm aprendido sobre a humanidade e a vida em sociedade? E como isso volta para nós, impactando a forma como lemos o mundo? É tempo de discutir que tipo de dados têm servido de alimento para os robôs porque isso já tem influenciado o futuro que estamos construindo.
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Formações customizadas
Nossas formações abordam temas relacionados à compreensão de direitos humanos de forma interdisciplinar, aplicada ao dia a dia das pessoas - sejam elas de quaisquer áreas de atuação - e ajustadas às necessidades de quem opta por esse serviço.
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Consultoria em promoção de diversidade
Temos percebido um movimento positivo de criação de comitês de diversidade nas instituições. Com a consultoria, podemos traçar juntos a criação desses espaços de diálogo e definir estratégias de como fortalecer uma cultura de garantia de direitos humanos.
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Minha empresa quer doar

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    Depoimento de professora de Campo Largo
    Em 2022, nosso colégio foi ameaçado de massacre. Funcionárias acharam papel em que estava escrito o dia e a hora que seria o massacre (08/11 às 11h). Também tinha recado na porta interna dos banheiros feminino e masculino. Como gestoras, fizemos o boletim de ocorrência na delegacia e comunicamos o núcleo de educação. A partir desta ação, todos as outras foram coordenadas pela polícia e pelo núcleo. No ambiente escolar gerou um pânico. Alunos começaram a ter diariamente ataque de ansiedade e pânico. Muitos pais já não enviavam os filhos para o colégio. Outros pais da comunidade organizaram grupos paralelos no whatsapp, disseminado mais terror e sugestões de ações que nós deveríamos tomar. Recebemos esporadicamente a ronda da polícia, que adentrava no colégio e fazia uma caminhada e, em seguida, saía. Foram dias de horror. No dia da ameaça, a guarda municipal fez campana no portão de entrada e tivemos apenas 56 alunos durante os turnos da manhã e tarde. Somente um professor não compareceu por motivos psicológicos. Nenhum funcionário faltou. Destacamos que o bilhete foi encontrado no banheiro, na segunda-feira, dia 31 de outubro de 2022, após o segundo turno eleitoral. Com isto, muitos estavam associando o bilhete com caráter político. A polícia descartou essa possibilidade. Enfim, no dia 08, não tivemos nenhuma ocorrência. A semana seguinte foi mais tranquila. E assim seguimos. Contudo, esse é mais um trauma na carreira para ser suportado, sem nenhum olhar de atenção e de cuidado das autoridades. Apenas acrescentamos outras ameaças (as demandas pedagógicas) e outros medos.
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