Por Érica Kamimura Nishimura
Em tempos de tensões globais e disputas geopolíticas cada vez mais complexas, a soberania nacional se mantém como um tema imprescindível para os Estados, mas o que de fato ela significa?
O que significa soberania nacional?
Mais do que a simples definição de fronteiras ou o exercício do poder político, ser soberano significa ter a capacidade de decidir coletivamente os próprios rumos com base em princípios democráticos, no bem-estar da população e sem manipulação de atores externos.
É importante destacar que essas decisões incluem questões sociais, econômicas, culturais e ambientais.
A soberania de um Estado, no entanto, não é garantida apenas por seus recursos naturais, pelo seu desenvolvimento tecnológico ou pelo tamanho de sua economia. Esses elementos, embora relevantes, não sustentam por si só a autonomia de um povo.
A base mais sólida e duradoura da soberania consiste na potência de uma população consciente, informada e participativa. São as pessoas em sua capacidade de compreender, discutir e defender seus próprios direitos que constroem uma soberania real, cotidiana e concreta.
Soberania nacional e educação em direitos humanos (EDH)
É diante desse contexto que a importância da educação em direitos humanos (EDH) se destaca como uma ferramenta indispensável.
A EDH pode ser considerada prática estruturante de uma sociedade democrática. É por meio dela que se constrói uma comunidade politicamente ativa, justa e plural, capaz de compreender seus direitos, defender sua autonomia e sustentar sua democracia mesmo diante de pressões externas, sejam elas sutis ou explícitas.
Ameaças a um país soberano
Eventos internacionais recentes mostram que a soberania pode ser ameaçada por mecanismos que não envolvem apenas armas ou ocupações territoriais. Em muitos casos, são estratégias indiretas, como imposições econômicas disfarçadas de cooperação, pautadas em supostas conclusão técnica, ou baseadas em desinformação, que tentam moldar decisões nacionais a partir de interesses alheios ao bem comum nacional.
Essas formas de pressão são ainda mais eficazes quando encontram populações desinformadas, desmobilizadas ou desconectadas dos valores democráticos. Quando os cidadãos desconhecem seus direitos e a história de suas conquistas, tornam-se mais suscetíveis a aceitar retrocessos como se fossem inevitáveis ou formas de desenvolvimento da nação, e a normalizar interferências como se fossem parte da ordem natural das coisas.
Por isso, a educação em direitos humanos pode e deve ser compreendida como uma prática de liberdade coletiva. Ela promove o pensamento crítico, a empatia, o respeito à diversidade e o senso de responsabilidade compartilhada. Ela prepara cada pessoa, desde a infância, a identificar situações de injustiça, a compreender contextos complexos, a dialogar com perspectivas diferentes e a se posicionar com base em princípios éticos e democráticos.
Direitos humanos no Brasil
No Brasil, a educação em direitos humanos é reconhecida como política pública e, conforme apresentado pela Constituição Federal, está indissociavelmente vinculada à educação formal, orientada para a cidadania e o pleno desenvolvimento da pessoa, segundo o art. 205.
Quando cultivamos esse tipo de formação, estamos fortalecendo a soberania do país por dentro. Não apenas em termos institucionais, mas pela consciência coletiva de que as decisões que afetam o presente e o futuro devem nascer do debate público, da escuta plural e da valorização dos direitos fundamentais.
Benefícios da educação em direitos humanos
Uma nação educada em direitos humanos tende a ser menos vulnerável à manipulação, mais resistente a retrocessos e mais apta a se manter firme diante de influências externas que não respeitam sua autonomia.
É importante compreender que essa formação não se limita à educação formal. Embora o espaço escolar tenha um papel central, a educação em direitos humanos deve se espalhar por toda a sociedade: nos meios de comunicação, nas organizações da sociedade civil, nas políticas públicas, nos espaços culturais e artísticos.
Trata-se de um esforço coletivo e permanente de formação cidadã, que não pode ser reduzido a um projeto pontual ou a um conteúdo específico. Ela precisa fazer parte da vida cotidiana das pessoas, com linguagem acessível, experiências significativas e compromisso com a transformação social.
Essa educação também tem uma dimensão internacional. Ao formar cidadãos e cidadãs com consciência crítica, ela contribui para que o país se posicione no mundo com mais segurança e dignidade. Isso não significa negar a interdependência entre os países, nem recusar o diálogo internacional. Ao contrário: uma verdadeira soberania se constrói com base em cooperação justa, respeito mútuo e participação equitativa nos espaços globais de decisão.
Cidadãos e cidadãs educados e educadas em direitos humanos são capazes de discernir entre cooperação legítima e interferência abusiva. Sabem quando um acordo internacional é benéfico para o país e quando ele impõe perdas disfarçadas de oportunidades ou pautadas em interferências políticas. A EDH permite a compreensão de que a defesa da soberania não se faz com fechamento ou isolamento, mas com consciência, organização e diálogo.
Para o que devemos olhar?
O momento atual exige vigilância. A conjuntura internacional tem se mostrado cada vez mais instável, com rearranjos de poder, disputas comerciais, mudanças climáticas e crises humanitárias que exigem respostas articuladas e firmes.
Nesse cenário, fortalecer a educação em direitos humanos é investir na soberania nacional de forma duradoura e enraizada. É garantir que, diante de qualquer desafio, seja ele velado ou explícito, a população tenha ferramentas para pensar criticamente, agir com responsabilidade e defender o direito coletivo de escolher seus caminhos com liberdade e dignidade.
Sem EDH, a soberania torna-se frágil e suscetível à forças ocultas e distantes da vontade popular. Já com ela, a soberania torna-se um compromisso inegociável, construída de forma compartilhada, consciente e democrática. É por isso que, mais do que nunca, é preciso compreender a urgência do diálogo e discussão dessa pauta.
Defender a soberania nacional, hoje, é também defender o direito de cada pessoa de conhecer seus direitos, participar das decisões coletivas e atuar na construção de um país justo, plural e livre. E isso começa, inevitavelmente, pela educação.
Saiba mais
Ainda está curiosa/curioso sobre o assunto, confira algumas autoras que nos inspiraram neste post.
BENEVIDES, Maria Victoria. Educação em Direitos Humanos: do que se trata? In: Seminário de Educação em Direitos Humanos, Anais…, São Paulo, 2000. Disponível em: http://www.hottopos.com/convenit6/victoria.htm.
LUCENA, Isabella. Democracia: a soberania da educação e dos direitos humanos. Café com FAC, Universidade de Brasília. Disponível em: http://cafefac.unb.br/acessorapido2/67-democracia-a-soberania-da-educacao-e-dos-direitos-humanos.
